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Gazeta em forma de e-meio 63 (14/9/2008)

Uma vergonha

Lula disse que só vai à reunião da Unasul, na segunda, 15/9/2008, que foi convocada pelo presidente Rafael Correa, do Equador, para apoiar e dar respaldo continental ao governo democrático da Bolívia, “se Evo Morales e a oposição na Bolívia pedirem”; senão, disse Lula, “será uma ingerência em outro país, e isto o Brasil não admite”.

O que ele chama de “oposição na Bolívia” é um exército paramilitar armado até os dentes pela embaixada dos EUA, incluindo muitos integrantes que só falam inglês, que comandam bandos de baderneiros, arruaceiros e delinqüentes de toda espécie, igualmente pagos e municiados pela mesma embaixada, e que, nos últimos dias, promoveram um massacre a bala contra camponeses desarmados (18 mortos e mais de 70 feridos), invadiram e depredaram patrimônios e repartições públicas federais, associações de bairros, sindicatos operários e camponeses, jornais, rádios e televisões, empresas públicas de telefonia, de águas e de eletricidade, e tudo mais que porventura apóia ou diz respeito ao governo de Evo Morales (que acabou de receber um maciço apoio popular de 70% do eleitorado com toda a mídia hegemônica nacional e internacional contra ele), em eventos de grotescas boçalidades, de aberta violência e exacerbados vandalismos, incêndios criminosos de refinarias, empresas públicas e sedes de sindicatos e associações, além de atos verdadeiramente terroristas como a explosão de oleodutos e gasodutos, tudo isso em quatro grandes estados do país e de forma sincronizada, coordenada e sob a orientação direta de Washington.

As Forças Armadas bolivianas, cujo comandante-em-chefe não é o presidente da República, mas um títere dos interesses alienígenas, assistiram a tudo de braços cruzados.

Porém, militares leais a Evo Morales flagraram toda a conspiração que foi coordenada de dentro da própria embaixada dos EUA em conexão com Washington, mas isto Lula não chama de “ingerência”, e o Brasil admite, sim, em covarde silêncio.

Todos os governos latino-americanos tomaram conhecimento e manifestaram os mais contundentes protestos. Evo Morales, em ato corajoso e soberano, expulsou da Bolívia o embaixador dos EUA. Em solidariedade a ele e por ser vítima de semelhante conspiração em seu país, incluindo até o magnicídio, Hugo Chávez também expulsou da Venezuela o embaixador dos EUA. Em Honduras, o recém eleito presidente Manuel Zelaya adiou o recebimento das credenciais do novo embaixador dos EUA por tempo indeterminado e até que a situação da Bolívia se normalize, e se dê por encerrada a ingerência espúria no seu processo democrático. Rafael Correa, presidente do Equador, também em contundente manifestação de apoio a Morales, pediu a convocação de emergência da Unasul para impedir que os desejos do povo boliviano expresso nas urnas não seja usurpado por bandos de vândalos, facínoras e terroristas que o ameaçam. Argentina, Paraguai, Chile, Nicarágua, Cuba, Uruguai, Peru e até a Colômbia, do narcoparapresidente Álvaro Uribe, manifestaram inequívoco apoio a Morales e confirmaram presença na reunião da Unasul. Somente o presidente do Brasil não se pronunciou, foi o Itamaraty que emitiu umas notas, com certa veemência mas também com suficiente vaselina para escorregarem legal nas gargantas profundas do Pentágono.

Agora, não tendo outra saída, Lula se pronuncia e dá legitimidade à “oposição” na Bolívia para convocar uma reunião da Unasul. Além disso, Morales tem de “pedir” a reunião. Ou seja, antes de dar o apoio a uma democracia violentamente ameaçada como a da Bolívia, inclusive com graves ameaças aos próprios interesses brasileiros, é preciso que o presidente Morales se ajoelhe na humilhante posição de pedinte. E a “oposição” a ele terá também de consentir na humilhação. Senão, é “ingerência”!?

Ao dizer o que disse, Lula conta com o bloqueio da mídia brasileira sobre a verdade na Bolívia. Mas hoje temos a internet, que sempre escapa a censuras. A Gazeta, por exemplo, conserva em seus favoritos quase uma centena de sites de opinião, jornalismo, rádio e televisão da melhor qualidade, com quadros de jornalistas de verdade, que pesquisam, confirmam informações, sabem escrever e não são paus-mandados de ninguém. Além disso, temos conexões com jornalistas e profissionais bem informados que nos passam ou repassam informações importantes e consistentes Assim, não adianta para nada a baboseira publicada pelos jornalistinhas pré-pagos da imprensa brasileira copidescando material de “agências de notícias” européias e norte-americanas.

Não sei o que está havendo com o nosso governo, ou com o nosso país. Dizem os jornais e as pesquisas da mídia hegemônica que a popularidade de Lula é a maior já registrada. A mesma notícia vem sendo repetida sistematicamente há anos, creio que desde a primeira eleição dele. E vem sendo confirmada nas urnas eletrônicas, que não confirmam o voto por escrito ao eleitor. Temos também de considerar que às massas não é dada outra alternativa. Ou é Lula, ou é quem?

Mas a questão aqui é a seguinte: não tínhamos tradição de governos populares pusilânimes e entreguistas no Brasil; este é o primeiro, infelizmente.

E a Quarta Frota cercando os novos poços da Petrobrás na Bacia de Santos. Se isto não é ingerência, o que é então, presidente? Ajuda militar?


Abraços

Mario Drumond

Em tempo: a presidenta do Chile, Michele Bachelet, que, na qualidade de presidenta de turno da Unasul e convocadora oficial da reunião, telefonou para Lula e o intimou a participar, independente de pedidos de Morales ou da “oposição na Bolívia”. Lula vai.


Revisão: Frederico de Oliveira (para quem curte textos bons e bem escritos, recomendo o blog de Frederico – O Apito - no endereço http://www.thetweet.blogspot.com).

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