Coleção completa por Volume (anual)

Gazeta em forma de e-meio 14 (9/11/2007)

A Gazeta andou devagar esses dias, por viagens do gazeteiro e, também, por uma preguiça danada dele, em dias de ócio meditabundo e criativo, nem sempre otimista. Contudo, retorna com uma boa notícia: foi convidado por Beto Almeida para debater Revolução Russa e Revoluções do Século XXI no programa Brasil Nação da TV Educativa do Paraná, em Curitiba, para onde segue hoje (sexta) à noite. Tô falando que Requião tá ligado!(*)


Interesse na Venezuela

Leitores têm questionado o evidente interesse deste gazeteiro na questão da Venezuela. Respondo que o interesse não é só dele, é do mundo inteiro. O mundo está de olho na Venezuela! E o principal motivo é que lá se está realizando, na prática e pela primeira vez na história, o que até então nunca passou de pura teoria: o poder popular, isto é, o socialismo real.

Circunstâncias históricas adversas e conjunturas externas e internas às sociedades que buscaram o socialismo, desde o início do século XIX, sempre impediram que nelas surgisse uma realidade de fato socialista em conformidade com as bases teóricas que vêm sendo levantadas e debatidas pelos mais eminentes sábios dedicados ao tema nos dois últimos séculos e, em particular, no que diz respeito ao que poderíamos chamar de síntese paradigmática do socialismo, que é o poder popular. Os casos de Cuba, Vietnam, Coréia do Norte, China, URSS e, se quisermos ir mais fundo na história, até os das repúblicas sul-americanas libertadas por Simon Bolívar, são exemplos clássicos dessa busca. Mas não lograram alcançá-la completa e vitoriosamente. Porque o capitalismo estava lá, poderoso e capaz de pôr freio à história. E ainda está aqui, mais poderoso ainda. Em alguns países e regiões, o caminho rumo ao socialismo se frustrou e seus povos esperam nova oportunidade histórica; em outros, seus povos ainda não teriam chegado lá.

Mas o mago da estratégia política e militar que se chama Hugo Chávez soube driblar todas as condições adversas e as poderosas defesas do capitalismo. E marcou um golaço!

Se nos alongássemos, teríamos um livro e não uma gazeta. Dezenas de livros foram escritos sobre a Venezuela nos últimos cinco anos, e outras centenas estão sendo escritos neste momento (este gazeteiro acaba de finalizar um) em paralelo aos milhares de ensaios, teses, artigos e reportagens que diariamente são publicados por veículos sérios e de resistência dos quatro cantos do planeta, como frutos de pesquisas competentes e vivências em profundidade. Em todos, há um elemento comum: o desmascaramento e a contestação radical da mídia hegemônica, que se pretende a forjadora da “matriz global de opinião”.

Exemplifico aqui com apenas um parágrafo, colhido ao acaso em artigo da jornalista Maria Sentís, publicado em 1/11/07, no site Rebelion, que traduzo: “Os recorrentes ataques contra a proposta de reforma da constituição venezuelana são somente o penúltimo capítulo de uma série de desclassificações viscerais, nascidas em sua maioria do interminável imaginário de fontes anônimas e do anedotário mais fútil perante o processo protagonizado na Venezuela por Hugo Chávez. Dentro dessa maré, muitas vezes se cai na torpeza de desqualificar um processo apoiado nas urnas com porcentagens entre 60-70%, em função unicamente de critérios formais e por pura alergia a uma estética, em lugar de valorizar os acontecimentos por seus conteúdo e transcendência, o que seria, ao menos, razoável.”

É que a Venezuela se tornou um assunto rico e importante demais para ser avaliado em função da propaganda e do jornalismo vulgares difundidos por empresas de comunicação interessadas em sabotar um processo que, pela primeira vez, põe de fato em risco a existência delas. Mas não a nossa, dos povos do mundo. As cabeças mais afiadas têm, pois, o dever de estar atentas à Revolução Bolivariana da Venezuela, que já influencia a cubana, a vienamita, a chinesa, a iraniana e a própria Rússia, além de se estender pela AL. Onde os povos sofridos da Bolívia, Equador e Nicarágua já se decidiram por ela, e outros, tão sofridos quanto, como é o nosso caso, precisam dela mais do que nunca.


Os quintas-colunas

O tipo não é exclusivo da América Latina, é universal. Celebrizou-se com este nome na Guerra Civil Espanhola, lá pelos anos 30/40. No Brasil, nós os chamamos também de “traíras”. São sempre reacionários, oportunistas e venais, fingindo-se de progressistas, desinteressados e probos. Geralmente, dão como cupins em madeira ruim nos espaços mais obscuros das burocracias estatais, inclusive as militares. Tais espaços lhes são propícios porque eles são, antes de tudo, uns fracos, uns covardes. Gostam muito das mesinhas, telefones, cafezinhos e outras infras custeadas pelo erário, e quanto mais próximas do poder, melhor para eles. São especialistas em sabotagens, boicotes, intrigas e demais atividades que não exigem estudo e trabalho, nem responsabilidades. Nunca construíram nada nem criaram coisa alguma, nem uma linha de texto sequer, exceto pelas miudezas narcisistas que beneficiam seus próprios egos mesquinhos e existencialmente miseráveis.

No caso da Venezuela, o quinta-coluna é, sem dúvida, o maior pentelho da Revolução Bolivariana. São os camaleões “quarta-república” que lograram manter-se em suas respectivas mesinhas no advento da Revolução.

Mas a atual reforma da Constituição Bolivariana, proposta por Chávez, os atinge em cheio. Retira-lhes, em definitivo, o poderzinho de que cada um deles ainda dispõe de postergar, de procrastinar, de retardar, de chantagear, enfim, de exercer a única atividade a que se adestraram bem, isto é, a de criar dificuldades para vender facilidades. E, já, a máscara começa a despencar-lhes.

Famoso, desde ontem, é o caso do general Raul Isaías Baduel, quase um ícone da Revolução, como o comandante de tropas que reverteram o golpe de Estado de abril de 2002, e que, inesperadamente “saltó la talanquera”, como lá se diz “pulou a cerca”.

Mas este gazeteiro não julgaria apressadamente o caso Baduel, porque aprendeu que Chávez e seu estado-maior dispõem de uma invejável inteligência estratégica, inclusive de contra-inteligência, que tem montado históricas arapucas para as mais poderosas artimanhas das oligarquias capitalistas que vêm tentado pegá-los desde o primeiro dia no poder.

Se eu fosse das oposições de direita na Venezuela ia ficar grilado com a súbita “conversão” de Baduel. Estaria Chávez nomeando até o novo e agora badalado comandante-em-chefe das oposições contra ele? De fato, não há como negar que Baduel, um velho de guerra, poderia funcionar como um perfeito cavalo-de-tróia colocado pela Revolução para detonar de vez a oposição de direita no país e seus aliados internacionais, e implantar uma nova oposição democrática, construtiva e crítica, da qual a Revolução vem necessitando, e muito. Não seria a primeira vez que Chávez apronta uma dessas.


Noel com prótese

O cinema brasileiro continua engatado na marcha a ré histórica em que enveredou a “quarta-república” neoliberal. O neoliberalismo no cinema é o mesmo da economia, ou seja, um “liberou geral” onde tudo pode, tudo vale, desde que seja a reboque da matriz (no caso, roliúde, no papel de uol-istrite).

Nada contra um cineasta de primeiro filme levantar grana para um filme sobre Noel Rosa. Mas tem de caprichar na pesquisa e no fazer cinematográfico, porque o tema já foi burilado e feito filme por um dos nossos maiores cineastas, que é Rogério Sganzerla. Não dá pra ignorar, muito menos fingir ignorar, a genialidade. Nem a de Sganzerla, nem a de Noel.

Mas o cineasta diz no jornal que leu um livro - só um! E achou o máximo botar uma prótese no ator principal “de forma a reproduzir na tela a deformidade facial do compositor”. Coisa de roliúde, é óbvio! Rogério não faria uma coisa dessas com Noel. O genial compositor, coitado, comeu um prego existencial por causa daquele fórceps mal puxado que o trouxe à luz. Se tivesse na época os recursos de hoje, ele seria o primeiro da fila para eliminar de si essa tal “deformidade facial”.

É um cinema brasileiro que não gosta do Brasil. E, como já disse alguém, quem não gosta do Brasil não me interessa.


Navio negreiro do Século 21

Enquanto a AL caminha para o Socialismo do Século 21, a Europa insiste em retrogradar no tempo histórico. A definição de Rodrigo Leste ao comentarmos o caso das crianças do Chade é perfeita: um navio negreiro, aéreo, em pleno Século 21! Acompanho pela TeleSur, desde a primeira matéria. Lá estava, no aeroporto do pequeno país africano, um grande Boeing da ONG francesa Arca de Zoé, ligada à primeira-madame Sarkosy, embarcando 103 lindas crianças “órfãs”, entre 10 a 15 anos de idade. Eis que uma autoridade chadiana desconfia daquela aeronave colorida, sem bandeira, sem chancela de empresa ou de coisa alguma, e resolve checar a documentação. Não bate nada com nada. A alegação de “missão humanitária” para levar órfãos desamparados do terceiro para o primeiro mundo começa a cair por terra. Os garotos não eram órfãos, eram sequestrados, e seus pais feito loucos à procura deles. Os franceses da ONG são presos junto aos espanhóis que tripulavam a aeronave. A investigação rapidamente revela a verdadeira “missão”, por entre os submundos sórdidos e macabros da pedofilia e do mercado de órgãos humanos, com envolvimento de muito peixe grande, ou peixes gordos, gauleses e ibéricos. É o escândalo! E, então, quem fica feito louco é o presidente francês, Sarkosy. Ainda bem que temos a TeleSur, porque a mídia hegemônica já começou a cair de pau na “criolada” do Chade. Mais um pouco e serão eles que estariam sequestrando suas próprias crianças para vender no “livre mercado” europeu.


Épocazinha que já era

Para este gazeteiro, a frase do ano é do atual presidente do Equador, Rafael Correa: “Não vivemos uma época de mudanças; vivemos uma mudança de epócas.”

A revista Época deu capa para Hugo Chávez esta semana, e seus diretores de “arte” se vangloriavam no próprio site da revista do “trabalho” gráfico bem-sucedido de deformação do rosto do líder - que segundo eles “tem uma cara gorda e simpática, não dá medo em ninguém” – para ficar com cara de mau e meter medo aos brasileiros, numa aberta manipulação da informação e numa demonstração clara de desprezo à inteligência de seus leitores. E ainda por cima se jactam da “façanha”.

Mas, em verdade, os dois “artistas” responsáveis pela “obra” só lograram refletir o desespero de seus patrões, que são os verdadeiros autores da “idéia”. Estes são de fato bem informados, e portanto já sabem muito bem que a época deles, a Época da Globo, já era!


Abraços

Mario Drumond

(*) O programa será transmitido pela RTVE-PR no domingo às 21h30 e será reapresentado na sexta-feira às 22h40. Para quem se interessar e não estiver equipado para vê-lo por TV a cabo ou parabólica, poderá fazê-lo via internet no site http://www.pr.gov.br/rtve

Revisão: Frederico de Oliveira (para quem curte textos bons e bem escritos, recomendo o blog de Frederico – O Apito - no endereço http://www.thetweet.blogspot.com)


Maru
Tá cada vez melhor, o nível informativo denso e revelador, um trabalho de utilidade indispensável. As questões que coloquei são as que confundiriam qualquer leitor. A bem da clareza, que deve ser o escopo dessa gazeteação de ótimo tamanho, vale dar uma sacada.
Abração
Fredera