Coleção completa por Volume (anual)

Gazeta em forma de e-meio 13 (31/10/2007)

Requião, por que não?

No atual quadro de absoluta falta de perspectivas para as mudanças de que necessitamos com máxima urgência para chegarmos, enfim, ao século 21 e nos colocarmos mais próximos de nossos vizinhos mais adiantados, o governador do Paraná, Roberto Requião, é o único político de expressão nacional com potencial para quebrar essa paralisis. A direita sabe disso, e a existência de Requião foi simplesmente abolida da mídia. As “esquerdas” não sabem, ou não querem saber, mas isto não é novidade em nossa triste república. Porém, o importante é fazer chegar ao povo, às massas – que já devem ter percebido que o petismo e o tucanismo são faces de um mesmo Janus (ou Judas) –, a palavra de Requião, a começar do seu discurso de vitória nas eleições para o segundo mandato, contra todos os inimigos do mundo. Não mais é desprezível, nem no Brasil, o poder de comunicação das mídias de resistência, alternativas e comunitárias, e é por elas que muita informação de qualidade tem escoado até as massas, à revelia das censuras midiáticas. Requião e as mídias de resistência podem se dar bem, e penso que devemos trabalhar para que a idéia se fortaleça (para quem não conhece o discurso da vitória de Requião, segue a íntegra no arquivo anexo).


Os “quarta-república”

Tal como o corpo humano, o corpo social, tão logo se valha de boa saúde, põe-se a expurgar de si tudo o que é daninho, nefasto, estranho e antagônico, e lhe fora introduzido pela moléstia que por má ventura sofreu. Prosseguindo na observação das tipologias sociais que se estão agrupando e se evidenciando por verem-se expurgadas pela boa saúde que a sociedade venezuelana vem conquistando no processo revolucionário, vamos examinar uma que lá denominam “los cuarta-república”. Talvez não seja propriamente uma tipologia social, mas um grupo ou uma classe de pessoas que foi gerada, cultivada, alimentada e engordada nas malfadadas “democracias representativas” latino-americanas.

Na Venezuela, incluindo-se os oito anos do período Chávez, contam-se cinco repúblicas, e a atual é chamada de “Quinta República”. O movimento político que elegeu Chávez pela primeira vez foi o MVR (Movimento V República). No Brasil, se fizermos conta semelhante, estamos como na Venezuela antes de Chávez, isto é, na “Quarta República”, sendo a primeira a “República Velha”, de 1889 a 1930; a segunda, a “República Nova”, de 1930 a 1964; a terceira, a ditadura militar (que também era república), de 1964 a 1985; e, finalmente, a nossa “quarta república”, de 1985 para cá.

Assim como a nossa “Quarta República”, a homônima venezuelana caracterizou-se pela ideologia francamente liberal e neoliberal e por todas as desgraças que conhecemos bem, sendo a principal o mais absoluto domínio da nação (ou danação mesmo, se quiserem) por parte das oligarquias entreguistas e anti-nacionais, associadas a políticos e burocratas, em todos os níveis de hierarquia em que lhes fora concedido estabelecer-se nos três poderes constituídos e demais poderes de Estado, e a uma mídia de pensamento único, exclusivista, monopolista, forânea e hegemônica, abrangendo todo o território nacional.

Tudo sob as rédeas selvagens e ferozes do capital “pornovideofasciofinanceiropolicial”, como diria nosso querido amigo, o escritor Gilberto Felisberto Vasconcellos.

Boa parte dessa gentalha a Revolução Bolivariana da Venezuela já pôs fora do poder e os juntou numa só canalha mista de velhos oligarcas, políticos e burocratas dos outrora “grandes partidos” que se revezavam no poder, proprietários primários e secundários (testas-de-ferro) das empresas de comunicação, hoje quase falidas e sem audiência (já teriam desaparecido se não fossem os recursos aportados por Washington) e os agentes lacaios de sempre: militares fascistas, jornalistas venais, sindicalistas pelegos, celebridades apaniguadas, policiais torturadores, sicários, mercenários e etcétera. Parte da canalha reside em Miami, sob a proteção do Império, muitos deles foragidos da justiça venezuelana por traição à Pátria (golpes de Estado) e outros crimes políticos ou comuns. Uns poucos peixes grandes e pequenos estão presos, cumprindo pena na Venezuela. Outra parte, por certas peculiaridades desse processo revolucionário, vive muito bem obrigado no próprio país – um deles até como governador de um dos estados mais importantes –, em plena atividade conspiratória à vista de todos, e em permanente conexão com seus pares maiameiros. Ainda uma parte menor conseguiu, à maneira dos espertos camaleões, manter-se nas entranhas do processo revolucionário, e estes são os “quinta-coluna”, outra espécie que o laxante revolucionário está expurgando, e a que dedicaremos algumas linhas na próxima Gazeta.

Viciados de poder, a distância dele produziu em todos, sem exceção, a conhecida “síndrome de abstinência”, que, no caso, estertora em paroxismos, delírios e outras alienações tresloucadas que deixam vazar, sem constrangimentos nem pudores, pelos veículos de comunicação de que são proprietários. É uma das causas da audiência que ainda mantêm aqueles veículos – a comédia dos horrores, a ópera bufa dos desesperados, que eles protagonizam, sem cessar e sem censura, ao pasmo de abismados telespectadores.

São presidentes de partidos sem militantes nem votos, de sindicatos e entidades de classe sem filiados nem associados, bispos e cardeais de igrejas sem fiéis, dirigentes de ONGs sem funções, jornalistas sem leitores nem opinião, ex-senadores, ex-deputados, ex-governadores, ex-prefeitos, ex-presidentes da república, ex-funcionários de alto escalão, ex-militares do alto comando, ex-magistrados, ex-proprietários de terras infinitas, ex-capitães de indústrias e monopólios, ex-chefes de polícia, e todos os demais agentes vinculados, além dos próprios proprietários e acionistas de empresas de comunicação, antes risonhos, cordiais e felizes celebridades da “quarta república” e, hoje, bisonhos, rancorosos e furibundos ”cachorros do império” (como os designa Chávez), a babar diante das câmeras como cães raivosos da intolerância reacionária e senil, e a vituperar obsessivamente o governo, contra a “ditadura militar”, a “falta de liberdade de expressão”, o “autoritarismo” e outros clichês arranjados por suas agências de propaganda, além do vexame de estarem sempre a pedir, de joelhos e publicamente, pelo socorro de “Bush e seus marines”. É um espetáculo do gênero “terrir”.

O maior problema deles agora é que as mídias revolucionárias sacaram o lance e começaram a selecionar e a reproduzir os “melhores momentos”, adicionando-lhes engraçados e criativos recursos de edição audiovisual, sublinhando o histrionismo dos quarta-república e fazendo despencar ainda mais a insignificante audiência que mereciam. “Chávez los tiene locos” – dizem os venezuelanos.


A idiotice de todos os tempos

De um dos meus filhos recebi o seguinte e-mail:

Pai, achei essa pérola no blog de um autor de novelas da Globo:

“Sim, Luciano Huck faz parte da ‘elite branca’, e sob nenhuma hipótese deve se envergonhar disso. Ele faz parte dela porque trabalha de sol a sol, e paga altíssimos impostos, sem os quais a ‘elite preta’, não muito chegada ao trabalho, não estaria recebendo as benesses do bolsa família. (e não me chamem de racista, por favor, não estou falando de negros, estou falando da oposição aos que são como o nosso querido Huck). Aguinaldo Silva”

Não conheço nenhum desses dois personagens, mas, pelo que pensam, devem ter sido “inspirados” em dois idiotas do Século XIX, com ambientação atual. Também os idiotas pensam, e deixam documentos e rastros históricos - e como! Quando digo pensam, no plural, o faço em dúvida, porque o idiota que assina a nota pensa para si e para o idiota a que se refere, sabendo, com certeza, que o idiota referido não detém essa faculdade, ao ponto de pagá-lo para isso. A redação é tão ruim e tão despudorada que nem se peja dos cifrões que saltitam luminosos nas entrelinhas. Os mesmos que saltitam nos bolsos do tal autor de novelas.

Depois dessa, pelo menos aprendemos que a idiotice nacional é dividida em dois grandes partidos das elites: os “que são como o nosso querido Huck” (a “elite branca”) e os que são “da oposição” (a “elite preta”). O cara não disse para não chamá-lo de racista? Puummm!!!


O novo matriarcado

“- As mulheres vão salvar o mundo” – disse Chávez ao cumprimentar a senadora Cristina Fernández por sua bela vitória nas eleições de domingo passado, para a Presidência da República Argentina. Ela prefere que a chamem assim, Cristina Fernández, ou, simplesmente, Cristina, mas, sendo esposa de Nestor Kirshner, o atual presidente, ela é Cristina Fernández de Kirschner, ou , para as oposições, Cristina Kirschner.

Chávez está de olho na promessa que a futura presidenta lhe fez recentemente, ainda como primeira dama (ela detesta este título, prefere o de senadora) e candidata, de aprofundar as reformas moderadas do marido e as relações com a Venezuela e a Revolução Bolivariana. Chávez apoiou publicamente a sua candidatura, o que acirrou ainda mais o ódio dos poderosos conservadores e da mídia argentina contra ela, o seu marido e tudo o que tem significado recuperação e progresso naquela outrora grande nação.

Toda a AL está de olho na audaz e corajosa Cristina, uma senadora rebelde e agitada que, há quatro anos, levou o marido à presidência da República, largando da posição de azarão como governador da província de Santa Cruz (o Piauí de lá), na longínqua Patagônia. Com data marcada para assumir a Presidência da Argentina em dezembro próximo, ela é uma promessa feminina no poder que todos desejam seja mais para Eva Peron do que para Rainha Cristina (mesmo sendo bela, não é nenhuma Greta Garbo). E que não negue fogo como, até o momento, foi o caso da presidenta chilena Michele Bachelet, o que, para Cristina, uma vez que é esposa de ex-presidente, a rebaixaria a uma Hillary Clinton latina.

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Mas a candidatura assumidamente bolivariana dessa eleição na Argentina foi a do grande cineasta Fernando “Pino” Solanas (La Hora de los Hornos, 1968, O Exílio de Gardel, 1985, entre muitos outros) que, sem fazer campanha (fez um novo longa, Argentina Latente) e se posicionando apenas simbolicamente como candidato a presidente da República, ficou em quinto lugar entre os 14 concorrentes, com quase 300 mil votos contados até agora, perdendo somente para os candidatos das coligações de partidos tradicionais ou do poder e que gastaram os tubos na propaganda de suas campanhas.

Valeu, Solanas, parabéns. Não vi ainda o novo filme, mas gostei muito.


Abraços

Mario Drumond

Revisão: Frederico de Oliveira (para quem curte textos bons e bem escritos, recomendo o blog de Frederico – O Apito - no endereço www.thetweet.blogspot.com)