Coleção completa por Volume (anual)

Gazeta em forma de carta 3 (15/9/2007)

Os segredos da Ilha

Muito valiosos os escritos que Fidel Castro vem produzindo desde que passou o poder ao irmão Raul, já faz mais de um ano. Ao par do enfoque contemporâneo - por onde Fidel dá vazão a observações lúcidas e preocupações sinceras sem afetá-las de sua condição de estadista e celebridade mundial mas, ao contrário, posicionando-se bem à vontade como homem comum ou jornalista engajado e pleno de autoridade sobre os temas abordados -, esses textos vão nos revelando, sem intenção declarada, nas entrelinhas e com sutileza, alguns dos segredos mais preciosos que a misteriosa Ilha vinha reservando à História em toda aquela quase inacreditável trajetória revolucionária que, em 2009, completará meio século de vitórias.

O maior dos mistérios da Ilha é, sem dúvidas, a sua capacidade de sobrevivência – digna! – diante de tudo o que passou. Para nós, latinos, não tínhamos como saber o que foi mais difícil para os cubanos, se a sabotagem capitalista ou a “disciplina” stalinista. Quando vemos os restos da União Soviética, em especial nas cabeças desfeitas e reacionárias das últimas gerações que afinal se “libertaram”, e nossa informação a respeito não é a da mídia capitalista, ficamos abismados. É assustador crer que aquela escória de humanidade possa ser fruto de 70 anos de socialismo. Socialismo? Com certeza, a União Soviética só conheceu algo parecido e muito embrionário nos primeiros sete anos pós-revolução, até a morte de Lenin. Também a China e outras experiências orientais tem nos decepcionado.

Eis que Cuba, tudo leva a crer, será para a História o primeiro estado de fato socialista, e, para além dessa posição de indiscutível vanguarda numa conquista que haverá de ser mundial, é hoje o grande manacial exportador da revolução socialista, o epicentro de onde emana sua melhor energia. Ter alcançado tais glórias é outro grande segredo que ainda conservava a bendita Ilha.

Antes de remeter o leitor às “Reflexões” dessa “força telúrica que se chama Fidel Castro”, como bem o definia “Che” Guevara, dou uma dica: desde o primeiro dia da revolução, Cuba não deixou passar um só dia sem semear na alma do próprio povo e dos povos do mundo as concepções humanistas mais nobres e, através de uma solidariedade abnegada, única e incondicional a todos eles, independentemente de quem os governa ou como são governados, vem contribuindo exemplarmente para reduzir o sofrimento humano, em especial o dos povos mais oprimidos.

Para ler alguns dos textos de Fidel em português (mal traduzido) vá ao seguinte endereço:

http://www.granma.cu/portugues/2007/reflexoes-do-presidente-fidel-castro.html

Para ler todos no original em espanhol:

http://www.granma.cu/espanol/2007/reflexiones.html


Sexo de Los Angeles

Se este título estivesse escrito em espanhol, seria o de um belo poema de Ludovico Silva e eu teria de traduzi-lo por “Sexo dos Anjos”. Mas aqui ele vem em português mesmo e se trata de um jogo de palavras para titular uma reflexão sobre o cinema de Hollywood.

O ator de teatro e crítico de cinema, Ronaldo Brandão, aponta o auge de Hollywood na década de 1940. Rogério Sganzerla preferia situar esse auge na genialidade, não de uma época, mas, de um cineasta: Orson Welles. Ainda que ambos estejam certos, é inegável que o cinema de Hollywood teve bons momentos nas décadas seguintes, talvez até nos anos 80. Depois diluiu-se, deteriorou-se, desintegrou-se, e hoje é o que chamamos sexo dos anjos (nada a ver com o poema de Ludovico), isto é, o que não dá frutos, é estéril, inconsequente.

A não ser pelo seguinte fato: se acompanharmos em retrospecto a curva que o levou ao auge e depois à decadência, vamos ver que ela antecipa um pouco a uma curva semelhante à da potência econômica que o gerou. Sendo o cinema uma expressão profética da nossa época, temos na situação do cinema de Hollywood de agora a antevisão bastante provável do que está para acontecer com o “império americano”.


Linguagem

Rodrigo Leste me alerta para o estilo panfletário da Gazeta. Não é o primeiro alerta que recebo sobre o mesmo defeito de estilo. Creio que a frequência a que tenho me dedicado à observação e à leitura dos meios de comunicação venezuelanos me influencia. Falo dos meios de resistência, revolucionários e anti-imperialistas, que lá são os de maior audiência, muito maior. A mídia hegemônica perdeu a parada, amigos. E perdeu feio. Comemoremos. Há uma distância enorme entre o que se publica lá e o que se publica aqui. É triste ver a que ponto chegamos: nossa imprensa não é mais do que um anexo descartável ao panfleto publicitário do mais reles e vil comércio de inutilidades consumistas. Sou avesso a esse panfleto e não consigo ser neutro. Sigo sendo panfletário, à maneira venezuelana. O imperialismo é o maior problema que vivemos na América Latina, da hora que acordamos até a hora que dormimos, e enquanto dormimos também. Este tem sido um pesadelo do qual não conseguimos despertar... até agora. São duas e meia da madruga. Vamos dormir com essa.

Abraços

Mario Drumond